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Alguém se importa?

Teresa Costa d'Amaral
Jornal O Globo
Rio de Janeiro
, 14 de maio de 2012

As responsabilidades sociais assumidas pelo estado brasileiro na Constituição de 88, a noção contemporânea de que políticas assistencialistas não constroem cidadania sólida, e as novas perspectivas de responsabilidade social das empresas públicas e privadas deveriam ter levado o Brasil a reverter o quadro de exclusão social em que vive grande parte dos brasileiros. Não consigo ver esse movimento de mudança feito com seriedade e continuidade.

A diferença nos últimos tempos, e que acontece pelo mundo afora, vem da transformação provocada pelo cada vez maior número de empreendedores sociais, que assumem o compromisso de trabalhar com inovação e resolutividade, sendo exemplo de resultados de longo prazo e de qualidade nas mais diversas áreas de atuação.

Quem apóia essas instituições? Em geral o Estado, através de dotações orçamentárias feitas na vertente do apoio político, concedendo recursos que na maioria das vezes não são relacionados com suas necessidades reais. Por outro lado, um cada vez maior número de empresas faz doações como se fosse responsabilidade social. Mas esse movimento, na verdade, tem mais a ver com imagem do que com apoio social.

Nos últimos 14 anos construímos o IBDD como uma instituição social exemplar, para concretizar a cidadania de pessoas com deficiência através da união de duas vertentes fundamentais: mercado de trabalho e defesa de direitos, uma idéia ainda não experimentada.

Queríamos inovar também na origem e gestão de nossas receitas, pretendendo não depender de verbas orçamentárias de governos. Decidimos que viveríamos com recursos resultantes da prestação de serviços para empresas públicas e privadas. Financiamento e missão se uniam de maneira inovadora. Os serviços prestados a empresas para o emprego de pessoas com deficiência eram receita para o IBDD e conquista de cidadania para as pessoas com deficiência, que não pagam nada pelos serviços que recebem.

Atendemos a mais de 50 mil pessoas nos nossos 14 anos de existência. Ganhamos mais de 95 % dos processos de defesa de direitos propostos. E a abrangência das ações mostra bem o descaso com a questão: discriminação, cadeiras de rodas, medicamentos, acesso à educação, meios de transporte. Ganhamos duas ações civis públicas até hoje não efetivadas. Empregamos no mercado anualmente em torno de 200 pessoas com deficiência, vencendo o descrédito, o preconceito, o desconhecimento.

Nossos recursos não vinham apenas dos serviços prestados a empresas privadas, quase sempre comprados em pequenas demandas. O recurso mais constante e regular vinha de contratos de prestação de serviços de colocação de mão de obra em empresas estatais. Duravam um tempo mais longo, medido em anos. Dessa forma, as estatais usufruindo de dispensa de licitação autorizada através da Lei 8.666, aumentavam seus funcionários terceirizados. Nos últimos anos, o destino nos pregou uma peça. As estatais resolveram atender a demandas políticas e negócios privados.

Restou ao IBDD viver dos superávits dos serviços prestados a empresas privadas e a uma estatal estadual da área de águas e esgotos. Ela tem consciência da qualidade da mão de obra e do investimento social que realiza e que permite ao IBDD financiar parte de seus 6 mil atendimentos gratuitos por ano.

Com o destino traçado sob o jugo de uma irresponsabilidade social sem sentido, o IBDD reduziu por duas vezes seus custos, mas manteve seus atendimentos gratuitos a tantas pessoas sem cidadania. Não sei até quando poderemos manter essa sobrevivência e uma pergunta me vem constantemente: se o IBDD fechar suas portas alguém se importa? Temo que não. Só se importarão as pessoas que atendemos. Até porque a relação de respeito para com as pessoas com deficiência não existe.

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Publicado no Jornal O Globo, 14 de maio de 2012


 
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